Cordel


ABC da Boca do Rio


 
A obra: Nesta obra o autor retrata a comunidade onde cresceu, onde fez amigos e construiu histórias. Num passeio literário em sua comunidade conhecemos os personagens, as personalidades, a história e as lutas.


Vou falar da minha aldeia
Para ser universal
Falar da comunidade
Que é reduto cultural
Peço a vossa atenção
Vou falar de coração
De onde sou natural

Esta tal comunidade
Chamada Boca do Rio
Litoral de Salvador
Na Bahia, no Brasil.
Fez-se palco da história
Da cultura e da memória
E os artistas reuniu

Tem a Praia dos Artistas
Reduto da Tropicália
Aloísio, Del, Verinha,
Com as cabanas de palha
Tartarugas e golfinhos
Já fizeram dali ninho
Hoje estão matando a praia

Quem já não ouviu falar
Lá do bar do Pimentinha
Na segunda-feira abre
Faça chuva ou ventania
Cabra que é bom bebedor
Bebe pinga ou licor
Sem jamais perder a linha

A nossa comunidade
 Tem tradição em barzinho
Bar de Roque, dos Coroas
E o nosso bar de Santinho
Nestes bares a cultura
Cerveja e literatura
Andam no mesmo caminho

Poucos sabem da história
Do Alto do São Francisco
Pois lá era cemitério
Dos povos mais primitivos
A nação Tupinambá
Escolheu este lugar
Pra abrigar seus entes idos

E o nosso Rio das Pedras
Dá tristeza de contar
Onde abundava antes
O peixe Tamboatá
Que nas secas das lagoas
Andava horas boas
Pra este rio encontrar

Lá na beira deste rio
Onde se pega guaiamum
Há um bom tempo atrás
Também se pegava pitu
Mas é grande a malvadeza
Hoje choro com tristeza
A morte do Pituaçu

As restingas que havia
Na nossa Boca do Rio
Tinha Cabeça de Frade
Gavião sempre existiu
Fruta de mandacaru
Alimento de anú
O Passarim de lá sumiu

O Parque do Pituaçu
Não está delimitado
Por isso que dia e noite
Vem sendo assassinado
A CONDER é a culpada
Salvador tá condenada
Seu  pulmão será roubado

Vem agora a EMBASA
E  o governo do Estado
Com um tal de Emissário
Pro problema ser sanado
Esgoto sem tratamento
Espalhado num lamento
Em nossa Praia do Corsário

Apesar desta grandeza
De luta e de cultura
Nosso canto sofre ainda
Resquícios de ditadura
Os pescadores da Colônia
Sem vergonha ou cerimônia
Jogados á sorte dura

Até de um Terno de Reis
A comunidade goza
Com o Mestre Zé Gaguinho
Grupo Semente da Roça
Ladainha e Cantoria
Farreando noite e dia
Que é disso que o povo gosta!

Se falar religião
Boca do Rio é singular
A AMORC Rosa-cruz
No Georgina é popular
Igreja de São Francisco
Mórmon e Espiritismo
Só falta Cristo Voltar

Terreiros de Candomblé
Todos sabem onde fica
Zen Budismo, Maranata,
Umbanda, Cabala e Wicca.
Na nossa comuna irmã
Só não tem o Taliban
Por que Alah não deu a dica

Selma do Acarajé
Frente ao seu tabuleiro
Nós temos a Quinta do Samba
Na Baixa do Cajueiro
Berimbau de Caboré
Aloísio andando a pé
Babalu velho guerreiro

Tem também um caso sério
Mistério de nossa praia
Dizem que é um buraco
 Que puxa quem se distraia
Quem nadar ali por cima
Garanto não faz mais rima
Vai morrer na Aratubaia

Poucos já puderam ver
As indígenas canoas
Nossa história primitiva
Tá apodrecendo à toa
Se for passear no parque
De Pituaçu de tarde
Conhecer é uma boa

Tem a puxada de rede
Quase todas as manhãs
E agora tem a feira
Para nossas artesãs
Artesanato nota mil
Só aqui na Boca do Rio
É renda pras tecelãs

Temos o Forró Lelê
Que é grupo de quadrilha
Tem fanfarra no IMEJA
Tem grupo de poesia
Biblioteca Prometeu
Com poeta amigo meu
E encontro de cantoria

Nós temos entalhadores
Escultores, artesãos
Toda arte é família
Nela são todos irmão
Seja barro ou areia
Seja tela ou madeira
Criam arte com as mãos

Estão sufocando a feira
Tradição desta comuna
Já mudaram de lugar
Varias vezes, não só uma
Quero ver quem vai brigar
Pois eu sei não vai tardar
Pra que nossa feira suma

Nós temos a Casa Koolping
Muito mais do que escola
A paróquia tem certeza
 Que cultura não é esmola
Tem aula de violão
 Idioma, digitação
e capoeira Angola

O Mestre Boca do Rio
Angoleiro de valor
A Capoeira Brasil
Regional pra entendedor
Tem Capoeira Palmares
Capoeira qualidade
Alunos de Mestre Nô

O Colégio Montessoriano
Agora já tem Faculdade
Essa é mais uma conquista
Da nossa comunidade
Só falta o ensino superior
Ser gratuito de verdade

Não podia esquecer
De falar de quem vos fala
Cresci na Boca do Rio
Onde Quem cresce não cala
Vou tentar falar de mim
Sem começo meio ou fim
Sempre evitando pala

Cordelista e Cantador
Poeta e Cangaceiro
Comunista e Trovador
Por opção Catingueiro
Eu sou a mosca na sopa
Quero ver quem cala a boca
Do Luar do Conselheiro



O Sebastianismo no Sertão



A obra: Nesta obra o autor retrata um assunto polêmico, pedra fundamental das revoltas no nordeste O Sebastianismo. Depois de anos de pesquisa e muita dificuldade, por conta de ser uma ordem mística e secreta, Luar trás à tona sob forma de cordel um pouco desta tradição que deu fama a estes sertões.



Vou contar sobre uma ordem,
 Secreta e misteriosa
Nascida em Portugal,
 Que chegou a terra nossa
Espalhou-se por todo o mundo
 e resgatou lá do fundo
A esperança milagrosa.

É aquela velha história,
 Do retorno do Salvador
Vindo num cavalo branco,
 Com papel de Redentor
Tirando o povo da desgraça,
 Da pobreza e da pirraça
Do prefeito e do Doutor.

Certo rei de Portugal,
 Por nome Dom Sebastião
Era jovem, destemido,
 Guerreiro e bom cristão
Brigador e bom nas armas,
Organizando cruzadas
Lutava com o coração.

A bandeira Lusitana
Tremulava em todo canto
O império já cobria,
 Quase todo o mediterrâneo
Mas pra Dom Sebastião,
Era quase obsessão
Cobrir a África com seu manto.

Por muitas brigas internas,
 lá dos sultões Marroquinos
Foi chamado o nosso rei,
 para apaziguar os meninos
Armou uma expedição,
20 mil soldados na mão,
E pôs-se logo a caminho.

Mas é claro que o sultão,
Inimigo Lusitano
Teve ódio e revolta
Contra o rei soberano
Organizou seus soldados,
 o destino era selado
Pelos povos muçulmanos.

Vinte mil Lusitanos,
 Contra cem mil fortes mouros,
Estava claro de quem
Seria arrancado o couro,
Lá em Alcácer-Kebir,
 Viria o nosso rei sucumbir
Como na arena, um touro.

Mas o mistério cobre o cerco,
 Do povo de Allah
O rei Dom Sebastião
 Desapareceu por lá
Não se encontrou o corpo,
 Dele vivo ou dele morto
Tava o mistério no ar.

No reino de Portugal,
 choravam senhores e senhoras
O reinado sem herdeiros
 ia para mãos espanholas
Pra consolo da dinastia,
 Só mesmo a profecia
Do retorno é que consola.

E é desta profecia,
 Que vou lhes falar agora
Que mudou completamente
 o rumo de nossa história
Briga de rei e sultão,
 Inspirou nosso sertão
à insurreição e glória.

A profecia do retorno,
 do rei Dom Sebastião
Virou mito, crença e credo.
 E quase religião
Ideal nacionalista,
 Transformou-se em comunista
Quando chegou ao sertão.

O sertanejo acostumado,
 À injustiça e pobreza
Esperava o retorno
 De um líder com grandeza
Pois pra um povo sofrer tanto,
 Deve haver em algum canto
Alguém que os proteja.

Logo os sebastianistas
 Chegaram ao nosso nordeste
Encontraram sofrimento,
Fé, fome, e peste.
Descobriram nos sertões
 Povos, populações
Esperando quem viesse.

Mostraram a esse povo
 o que a Bíblia falava
Não tem jeito, estava escrito.
 Tava errado quem roubava.
Como na Maçonaria,
 Injetava ideologia
Quando de Cristo falava.

Logo, logo o sentimento.
 De revolta com razão
Fez-se bandeira de luta
 O rei Dom Sebastião
Que sumiu numa peleja,
Defendendo a Santa Igreja
E o mandamento cristão.

De Deus a revolucionário,
Jesus Cristo passou
O rei Dom Sebastião
Tornava-se o redentor,
Só faltava o povo agora,
Se inflamar de fé e glória
E guerrear com o malfeitor.

A primeira insurreição
 Deu-se lá em Pernambuco
Silvestre José dos Santos,
 Que diziam ser maluco
Na Serra do Rodeador
Esperava o Redentor
E fez guerra contra o Impuro.

Este fato aconteceu
Em mil oitocentos e dezessete
Quando muita gente foi
 Ajudar Mestre Silvestre
Todos de arma na mão,
Fazendo revolução
Contra o opressor do agreste.

No Nordeste o opressor
 Sempre esteve no poder,
Por isso era difícil,
Lutar pra sobreviver,
Quem criar comunidade,
Com justiça e igualdade,
Se prepare pra morrer.

A segunda insurreição,
 Foi no sertão do Pajeú
Entre o sertão da Paraíba
E a terra do Maracatu
Em mil oitocentos e trinta e cinco,
 O soberano era bem vindo
Em terras de Céu Azul.

O Beato João Antônio,
Líder desta comunidade,
Viu as pedras encantadas,
Lá pertinho da cidade
Conclamou o povo todo
Para correr num sufoco.
Pra morar na eternidade.

O desespero desta gente,
Que vive à própria sorte
Fez ouvir a voz do mestre
Que dizia firme e forte:
Vem morar na imensidão,
Com o rei Dom Sebastião
Vamos se entregar à morte.

O suicídio coletivo
Que aconteceu por lá
Foi a mais cruel imagem,
 Da injustiça do lugar
Pois lá no alto sertão
 Verdadeira insurreição
Foi morrer pra não matar.

A terceira insurreição,
                                                           Foi valente e mais famosa,
É cantada e declamada,
Em verso, canção e prosa,
Foi no sertão da Bahia,
Onde guerra e poesia
Fizeram-se bala e trova.

Falo da guerra de Canudos,
O reduto Monarquista,
Tinha Crente, rezador,
Xamã e sebastianista
Bom Antônio Conselheiro,
 Cearense, catingueiro
Pregava guerra na missa.

Foram quatro as batalhas,
 Que houve na Terra Santa
O exército brasileiro,
 Não poupou velho ou criança,
Lutando com fé em Cristo,
Pelo pasto coletivo,
E em Antonio a esperança.

Guerra má, sem precedentes,
 Neste meu sertão amado
Foi a guerra de Canudos,
Dos guerreiros encourados,
No final sem esperança,
Um velho, dois adulto e uma criança.
Contra cinco mil soldados.

Observem a resistência,
 De todas as formas de luta,
Logo, logo, são esmagadas,
 De forma absoluta
Aqui eu me contradigo,
 Pois ainda resta um grito,
E permanece na labuta.

Todas as insurreições,
 Que houve no Nordeste,
Políticas ou messiânicas,
Com comandante ou com mestre
Todas elas ocorreram
Por que os povos careceram,
Do que ainda carecem.

Povo oprimido é pólvora,
Com fome é dinamite,
Nem o preto, nem o branco,
 Nem o caboclo resiste
Pois na hora da verdade,
João Diabo vira Abade,
E corre mesmo é pro rifle. 

A história do retorno
Do rei Dom Sebastião,
Ainda corre calada
 No meio deste sertão,
Num cochicho, numa prosa,
 Os cabra valente da roça
Tramando revolução.

E se um dia ao acaso,
 Pegares a Bíblia pra ler,
Vai ver que todos têm,
 O mesmo direito de viver,
Peço-lhe tome cuidado,
 O governo tá no encalço
De quem a Cristo obedecer.


A saga da pedra do Bendengó



A obra: A pedra do Bendegó, ferida latente no povo catingueiro, o maior meteorito encontrado no Brasil, roubado pelo Império e levado ao museu Nacional no Rio de Janeiro é o tema deste cordel de protesto.
Que traduz a insatisfação popular e o descaso das autoridades brasileiras em preservar nosso patrimônio.


Todos conhecem a Caaba,
A pedra dos muçulmanos
Fica no templo de Meca,
Protegida dos profanos
A pedra que veio do céu,
É a crença dos puritanos

Agora vocês imaginem,
Como este povo é valente
Se roubassem a pedra santa,
A guerra seria iminente
Preparavam munição
Para lutar ferozmente

Outra pedra incandescente
Oriunda do espaço
Foi a que guiou a rota
De Cristo, aos três Reis Magos.
Os meteoros fazem parte
De objetivos sagrados

Igualmente ocorreu
No meu sertão da Bahia
A pedra caiu do céu,
Trazendo a profecia
Da vinda do Conselheiro
Que a todos libertaria

Em mil setecentos
e oitenta e quatro
No riacho Bendegó,
Numa fazenda de gado
Bernadino da Motta Botelho,
Descobriu o rochedo sagrado

O povo todo fez festa
Por conta da pedra santa
Pois ela veio do céu
Pra trazer esperança
Além do profeta da gente
Riqueza e temperança

É claro que estava certo
O que pensava o povo
Logo, logo haveria,
Pessoas do mundo todo
Injetando muito dinheiro
Pra quem vive de tão pouco

Ledo engano, sonho ingênuo,
A esperança do povão
Mas é claro que a riqueza
Não seria do sertão
Pois era o maior meteorito
Que o Brasil tinha na mão

Pesando cinco mil
Trezentos e sessenta quilos
A pedra já atraia
Pessoas de vários estilos
Pensadores, penitentes,
E Caçadores de mitos

O governo como sempre
Pensando no estrangeiro
Decidiu levar a pedra
Para o Rio de Janeiro
Melhor ir à capital
Que na terra do Conselheiro

Em mil setecentos
E oitenta e cinco
Foi a primeira tentativa
De profanar nosso recinto
A magia ia reinar
Contra nossos inimigos

O governador geral da Bahia
Com usura indisfarçada
Ordenou esta tentativa
Pensando ser ouro e prata
Doze juntas de boi,
Buscar a pedra sagrada

E pela primeira vez,
Fazendo a vontade divina
A pedra do Bendegó,
Escolheu sua própria sina
Há cento e oitenta metros,
Caiu ao virar a esquina

A pedra caiu às margens
Do riacho Bendegó,
Estava claro era um sinal
De Deus na terra do sol
Ficaria cento e dois anos
Sem mover-se a um metro só

Depois de tanto tempo
De fé e procissão
A pedra do Bendegó
Sofreu nova traição
Pois Dom Pedro Segundo
Mandou nova expedição

Chefiada pelo tenente
José Carlos de Carvalho
O que ele não sabia
Teria muito trabalho
A pedra queria ficar
Em terra seca e cascalho

A carreta teve o eixo
Quatro vezes partido
Foram 108 kilômetros
De puro sacrifício
O governo não entendia
Deus tentava impedi-lo

A pedra dos Conselheiristas
Caiu três vezes no chão
O inimigo não deu importância
Caiu mais três vezes então
Só ai são sete quedas
De pedra no Riachão

Cada vez que ela caia,
Mostrando que queria ficar
Era a maior dificuldade
Pra voltar a carregar
Pois a nossa pedra sagrada
Tinha o peso pra dificultar

Mas os homens de má fé
Estavam resolutos
Levariam a pedra santa
De uma vez a qualquer custo
O dinheiro fala mais alto
Neste meu Brasil injusto

Prolongada a estrada
De ferro do São Francisco
Facilitava o trabalho
Maldito do inimigo
A pedra ia pro Rio
Pra evitar mais sacrifício

O trem levou ao porto
A nossa pedra bonita
De navio a pedra foi
À quinta da Boa Vista
Foi à mão dos cientistas
Numa atitude egoísta

Assim que a pedra chegou
As mãos que não crêem em mitos
Cortaram logo um pedaço
De uns bons sessenta quilos
Se achares que exagero
Vejam o meteorito

Pegaram o pedaço
Que eles cortaram primeiro
Em quatorze partes iguais
Re-dividiram ligeiro
Só pra doar à quatorze
Museus pelo mundo inteiro

A pedra do Bendegó
A pedra da profecia
Está no Rio de Janeiro
Exposto pra burguesia
Facilitando pro estrangeiro
Que tanto a pedra queria

O povo do meu sertão,
Da região Conselheirista
Frustrado com o roubo
Debaixo de suas vistas
Clamariam por respeito,
Contra essa ação imperialista

A pedra constituída
De Ferro, Níquel e encanto.
Até o dia de hoje
Provoca tristeza e espanto
Queremos nossa pedra de volta
De volta pro nosso canto

Advirto ao senhor Presidente
Devolva nossa Tradição
A pedra do Bendegó
Faz parte da religião
O Povo do Conselheiro
Reclama seu coração!



Peleja do boi valente com o menino aboiador



A obra: Este cordel é baseado na história do nome da cidade, terra do sisal, Valente, Sertão da Bahia. Conta a peleja de um bicho encantado que existiu de verdade e pouca gente sabe. Um exemplo de quantas histórias bonitas nosso sertão encerra e que não chegam ao conhecimento do povo do resto do Brasil.


Vou contar-lhes uma história
Que aconteceu no sertão
Não é mito, fantasia.
Aconteceu neste torrão
Onde verso e cantoria
Tem a mesma tradução

Pois lá neste torrão
Pouco pra lá de Serrinha
Criava-se muito Gado
Porco, cavalo e galinha.
Mais era o Aboiador
O tradutor desta terrinha

Mas num dia de encanto
Naquelas terras de Deus
Vaqueiros ficaram atentos
A um belo boi que apareceu
Tava selado e era fatal
O que a este boi sucedeu

O Bicho foi fazendo fama
Porque era bravo, indolente.
Era um bicho selvagem
Arredio e sorridente
Vaqueiros e aboiadores
O chamavam Boi Valente

O Bicho não respeitava
Aboio ou tangerino
Se machucava na cerca
Lutando, Brigando e fugindo.
Os fazendeiros logo vendiam
Aquele animal ferino

Cada criador que ousava
Comprar aquele animal
Só tinha dor de cabeça
Prejuízo capital
Prá vender tinha que levar
Era um perigo total

E foi numa destas vendas
Que tocando a boiada
A peleja aconteceu
Nestas terras encantadas
Boi Valente e Menino Aboiador
Brigaram pelas quebradas

Boi Valente desgarrou
Da boiada em disciplina
Pelo meio da Caatinga
Escolhendo sua sina
Nem o Chamado do berrante
Fez o boi parar em cima

Mas é claro, o comprador,
Não sabia o resultado
Não sabia da peleja
Que rolava lá no mato
Problema do tangerino
Já viu menino tanger gado!

Os vaqueiros encourados
Correram pra derrubá-lo
Mas Boi Valente dava nó
Em quem tentava pegá-lo
Logo logo os vaqueiros
Ao menino se juntaram

Os cabra correu pra cima
Pra pegar o boi fujão
O bicho brigou na ponta
Derrubou vaqueiro no chão
E Chamou os cabra pra guerra
Que ele faria no sertão
  
Os vaqueiros fizeram plano
Prá pegar o Boi Valente
Cercariam o animal
Nos lajedos reluzente
Amansariam o boi brigador
Pra levá-lo ao cliente

Foram horas de picula
De peleja nas quebrada
Boi Valente dando olé
Em quem seu rastro pisava
Era a própria liberdade
E a poeira levantava

Só que o plano arquitetado
Pelo vaqueiro experiente
Funcionou depois de horas
De peleja no sol quente
Os vaqueiro pegador
Cercaram o Boi Valente

O Animal ficou nervoso
Com a nova situação
Tentou brigar na ponta
Viu que ali não dava não
Viu que atrás era um buraco
E em volta os cabra do sertão

Todos conheciam o poço
De pedra no mei do mato
Um buraco mei profundo
Com os lajedo pareado
Boi valente tava perto
De ser pego e amarrado

Mas, porém aconteceu
O que ninguém esperava
O Menino Aboiador
Bem à frente estava
Pegou o berrante encantado
E a peleja começava

Os vaqueiros não entendiam
O que estava acontecendo
Aquilo não era hora
Do berrante do pequeno
O menino lembrava que um dia
Seu avô foi lhe dizendo

Se um dia você encontrar
Um boi que seja arrinado
Que arrebenta cambão
Que cabra nenhum pega o cabo
Use este berrante ancestral
De seu velho tocar gado

Cada verso encantado
Pra amansar o boi fujão
Fazia o bicho mugir
Se esquivar e ciscar chão
Mas o olho do tangerino
Também fazia encantação

O Menino Aboiador
Tinha um medo no coco
Que o bicho escolhesse
Saltar pra dentro do poço
Por isso o tangerino infante
Aboiava feito louco

Mas destino de bicho encantado
É virar mote de assunto
Virar conto, verso, aboio
Cantoria para o mundo
Assim nosso Boi Valente
Pulou ao poço profundo

Os vaqueiros entristeceram
Com a morte do animal
Botaram o chapéu no peito
Vendo a cena fatal
O tangerino jogou o berrante
E uma cruz de flecha de sisal

N’aquele dia encantado
Nas veredas do sertão
Incó, Pau-de-rato, Umburana
Cassutinga e Pinhão
Souberam desta peleja
E suas flor não saiu não

O exemplo de coragem
Luta pala liberdade
Fez o povo transformar
Aqueles campos em cidade
Ao morrer contra o cambão
O Boi deu exemplo de coragem

Cidade fundou-se com um nome
Terras do Boi Valente
Mudou Mais à frente o nome
Chamava Valente somente
Terra de sisal em fartura
De gente brava e sorridente

Num cantinho da cidade
Tem uma placa de cimento
Falando do Boi Valente
Sua força e seu exemplo
Tem Carneiro profeta místico
Cheio de conhecimento

Obrigado bravo boi
Ter cumprido a profecia
Cumprido o seu papel
Semeando a alforria
Espero que os cabra da roça
Lembre disso algum dia
  

Montalvânia, uma cidade diferente



A obra:O Brasil é repleto de cidades consideradas mágicas,o autor em viagem à Minas Gerais soube da existência de uma delas, na fronteira de Minas com a Bahia,Montalvânia. Uma viagem ao insólito e surreal jeito Brasileiro de ser.


Esta história é real
Não é mito popular
Entre Minas e Bahia
Manga é o nome do lugar
Nhandutiba o município
Onde nasceu quem vou contar

Mil novecentos e dezessete
Nasceu Antônio Montalvão
Naquela terrinha mineira
Mesclando cerrado e sertão
Nascia predestinado
A ser lembrado em seu chão

Aos vinte e dois deu um tiro
Matou um cruel capataz
De um Coroné de Goiânia
Antônio já era um rapaz
Partiu Montalvão pro exílio
Em busca de vida com paz

Antônio que nem terminara
O terceiro ano primário
Agora em Buenos Aires
Lia até dicionário
Estudou de tudo um pouco
Virou um revolucionário

Mil novecentos e quarenta e nove
Do exílio retornava
Voltou sabido, requintado
Até filosofia dominava
Mas tinha uma idéia grande
Uma cidade seria fundada

Voltou com essa idéia
Que alguns julgaram insânia
Criar uma cidade mística
Isso seria uma façanha
E o nome da cidade?
Mas é claro! Montalvânia!

A idéia era simples
Centro de desenvolvimento
Uma cidade moderna
Sem tristeza e sem lamento
A idéia de Montalvão
Era trazer conhecimento

Estas terras antigamente
Fazenda Barra dos Poções
Tinha verde mata virgem
Muitos vaqueiros, Peões
Montalvão comprou as terras
E derrubou as plantações

Começou o seu projeto
Da cidade planejada
O povo participando
Foi mais rápida a empreitada
Mil novecentos e cinqüenta e dois
Já estava terminada

Dia vinte dois de Abril
Do ano de cinqüenta e dois
O destino da cidade
Só viria então depois
Pois emancipar a cidade
Seria feijão com arroz

Cada Rua de Montalvânia
Era um nome da história
Filósofos e heróis
Que ficaram na memória
Que inspiraram o planeta
Á conhecimento e glória

Era Rua Schopenhauer
Avenida Galileu
Tem a Praça Platão
Rua Plutarco e Prometeu
Até Rua Zoroastro
Montalvão não esqueceu

Tem a Praça Cristo Rei
Marco zero com certeza
A Avenida Confúcio
Com largura e com grandeza
Tem a Avenida Buda
A cidade é uma beleza

As margens do Rio Cocha
Afluente do Carinhanha
Na Bacia do São Francisco
Muito linda Montalvânia
Lá no meio do cerrado
Pedra mor da miscelânea

No aniversario de três anos
Da cidade planejada
A polícia foi chamada
Pra acabar com aquela farra
Montalvão entrou no meio
E a briga foi dobrada

Ele deu tiro no sargento
Escapou de oito soldados
Falam até de Montalvão
Sumindo por dentro do mato
Virando toco de pau
Escapando dos macacos

A cidade tava pronta
Só faltava emancipar
Havia dois coronéis
Prumode dificultar
João Pereira e Pastor Filho
Chefes Políticos do lugar

Montalvão teve a idéia!
Em Manga virar Prefeito
Mil novecentos e cinqüenta e nove
Assumia  aquele pleito
Com Montalvão no poder
O plano era perfeito

Em mil novecentos e sessenta
Conseguiu a maior loucura
Pegou o material necessário
Pra funcionar a Prefeitura
Botou tudo encaixotado
Com a sua assinatura

No dia seguinte o povo
Ia mesmo se chocar
Pois a prefeitura de Manga
Tava a oitenta km de lá
No centro de Montalvânia
Para a cidade emancipar

Durante o seu mandato
Vendeu duas propriedades
Para asfaltar Montalvânia
Melhorar sua cidade
Soltou um boi branco na pista
Como símbolo de divindade

Lá tem água encanada
Telefone e correio
Tem posto de saúde
Pra tratar o povo inteiro
Tem campo de aviação
Pra voar com passageiro

Montalvão queria agora
Um eixo de desenvolvimento
De Montalvânia à Brasília
Uma estrada de sustento
Como uma linha direta
Pra acabar com o passo lento

Mil novecentos e sessenta e seis
Partiu de foice e enxada
Quarenta homens na mão
E foi abrindo picada
Quinhentos e quarenta e três
Quilômetros de estrada

Botou uma caminhonete verde
Marca Willys, nada mal
Sentou ligeiro ao volante
Montalvão era radical
Inaugurou a primeira linha
Direta com a Capital

Sonhava Montalvão
Com a nova Tróia invencível
Com os Templos do Monte Albán
No México imperecível
Por isso ele construía
 Tudo dentro do possível

Tava realizado o sonho
De Antônio Montalvão
Conseguiu criar a cidade
Que sonhara no sertão
Construiu a Montalvânia
Com enorme precisão

Ele havia descoberto
Nas grutas da região
Pinturas de antigos povos
E pôs-se a fazer tradução
Viu que aquela localidade
Seria uma grande nação

Terminada a cidade
Naqueles campos agrestes
Montalvão teria tempo
Para as pinturas rupestres
Ou como ele chamava
Bíblia de Pedra dos Mestres

Montalvão criou o instituto
Filantropo Cochanino
À beira do rio Cocha
No cume do monte Lopino
Grande centro esotérico
De onde soava um sino

Montalvão não era só
No estudo de arqueólogo
Tinha o apoio incansável
Do amigo João Geólogo
Quem encontrava pinturas
Veria fósseis logo logo

Uma prova viva disso
Foi o gigante encontrado
Montalvão fez profecia
De um grande corpo enterrado
Era uma preguiça gigante
O fóssil foi logo achado

Com ajuda de esotéricos
E místicos de carteirinha
Montalvão foi batizando
E traduzindo cada linha
As pinturas revelavam
Tudo que na terra tinha

Tem a Lapa da Hidra
De Zeus e de Posseidon
Abrigo dos Diplodocos
Lapa do Deus Amon
E a lapa do gigante
Da preguiça megaton

Para ele Montalvânia
Era o berço da humanidade
Por isso a insistência
Em construir a cidade
Era isso que a Bíblia de pedra
Revelava na verdade

O povo ficava besta
Com as coisas de Montalvão
Dizia que as pinturas
São de antiga civilização
Que voavam em aparelho
Disco voador e avião

Que quando veio o dilúvio
Eles foram para marte
O mundo criou nova vida
Da qual todos nós somos parte
Aonde tem água e terra
E não há comida que falte

Montalvão acreditava
Que naquele cerrado
Era o centro do universo
O tal de DELOS OMPHALO
Montalvão tinha umas coisas
E uns nomes invocados

Montalvão voltou à prefeitura
Em mil novecentos e setenta e três
Era candidato único
Mas quase perde de uma vez
E o seu adversário
O voto em branco camponês

É que o querido Antônio
Era meio radical
O que fosse acontecer
Era da sua forma tal
Se não fosse a sua maneira
O problema era geral

Montalvão escreveu livros
Dois, pra não mentir pra você
Um, era meio romance
O outro causava arêrê
Pois de uma só vez contestava
Einstein, Newton e Lavoisier

Montalvão desencarnou
No ano de noventa e dois
Aos setenta e cinco anos
Só virou história depois
Morreu de ataque cardíaco
E lá pro infinito se foi

Seu túmulo é uma pirâmide
De mármore negro sem tinta
No centro do cemitério
De sua cidade tão linda
Assim como tudo que nasce
Chega uma hora que finda

Montalvânia continua
Pobre linda e maltratada
Dezessete mil habitantes
Esperando verba paga
Pelo menos até Manga
Uma estrada asfaltada

Agradeço ao amigo
Vicente Jaú de BH
Ter falado em Montalvânia
Prumode eu pesquisar
É verdade meu amigo
O que tu falou de lá


João Requizado, o Cangaceiro Solitário 


A obra: Nesta obra o autor traz a tona uma história real e pouco conhecida, a história de João Requizado, o único cangaceiro solitário da história, que lutou sozinho, por mais de seis anos contra as forças do Estado.


Mais uma destas histórias
Que só existem no sertão
Que mostram a resistência
A injustiça e opressão
Pois o povo sertanejo
Só morre de arma na mão.

Este fato ocorreu
Como muitos no nordeste
O povo sempre oprimido
Pela sede, fome e peste.
Na competição da vida
O sertanejo leva o teste

Na Serra da Cravada
Na Chapada Diamantina
Nasceu João Requizado
Filho de Dona Vitalina
Com Seu Emídio Fortunato
Tava escrita sua sina

Tinha também quatro irmãos
Unidos sem desengano
Eram eles: Canuto, Ciro,
Pedro e Feliciano.
Mas eram suas três irmãs
O ciúme deste mano

Eram Jovita, Jovelina,
E a doce Maria Isabel.
Viviam a vida pacata
Em seu pedacinho de céu
Nas lavras diamantinas
Cumprindo remido papel

Jovita e Maria Isabel
Casaram com dois garimpeiros
Que viviam na penúria
Por que não tinham dinheiro
Pois a escassez de diamantes
Assolava o garimpo inteiro

No dia doze de Abril
Do ano de trinta e três
Jovita e seu marido
Desentenderam-se de uma vez
Até bater nela ele bateu
Arrepara o que ela fez

Saiu correndo para a Estiva
E queixou-se ao seu irmão
Tava agora anunciada
Princípio de revolução
Requizado pegou ar
E foi de ódio com razão

Apôis João Requizado
Só deixou passar um dia
A sexta-feira Santa
Dia de fé e alegria
Mas no sábado de Aleluia
Foi resolver a arrelia

No caminho prá Estiva
Já pertinho de Mosquito
Requizado encontrou
Num azar mei esquisito
O cunhado Rogaciano
E começou o alarido

O bravo João Requizado
Partiu pro covarde cunhado
Aplicou-lhe uma surra
Do jeito que tá mandado
O cabra ruim ficou mole
Ferido e desacordado

Ficou sabendo que o mesmo
Fazia o marido de Isabel
Que ele também agredia
A esposa de modo cruel
Resolveu fazer visita
Pra acabar com o escarcéu

Foi à casa da outra irmã
E o outro covarde encontrou
Altino Ferreira da Silva
Com quem Isabel se casou
Estava com febre palustre
Mas isso não adiantou

João Requizado quebrou
O outro cunhado no pau
Deixou feio e ensangüentado
O corpo daquele animal
Fraturou o braço esquerdo
Deixando a cena fatal

Altino depois de uns dias
Foi dar queixa de João
Na cidade de Lençóis
Buscando por solução
A pior tava por vir
E virar perseguição

Pois duas semanas depois
Altino Ferreira morreu
Morreu de febre palustre
E da surra que João deu
Começava a história dum cabra
Que o povo não esqueceu

Requizado ficou tranqüilo
Apôis foi caso de família
Como bateram em sua irmã
Podia ser sua filha
Qualquer pessoa com honra
Ficaria uma pilha

Porém num dia de sábado
Dois soldados bem armado
Matias e João dos Santos
Eram os nomes dos “macaco”
Tentaram efetuar a prisão
Do nosso João Requizado

Quando deram voz de prisão
Com as armas apontadas
Requizado deu meia volta
E saiu a galopadas
Montado em bom cavalo
Pelo meio das descargas

Quinze dias depois
Os mesmos soldados de outrora
Tentaram de novo prender
Requizado onde ele mora
Mas esta nova tentativa
Também entraria para a história

É que nosso João Requizado
Escapou da refrega de novo
Por um campo de futebol
Segundo nos conta o povo
Debaixo de bala de fuzil
Subindo e descendo morro

Em dezenove de setembro
Do ano de trinta e um
Nomeado interventor
Sob o canto do anum
O Juraci Magalhães
Sem escrúpulo nenhum

Mandou tenente Zacarias
às lavras diamantina
Pra ser novo delegado
Promover carnificina
Zacarias Justino dos Santos,
Requizado... Sua sina

Mandou prender Requizado
Lá na vila da Estiva
Deu ordem ao subdelegado
João Pereira da Silva
Chamado “João da Dominga”
Homem bom de voz ativa

Mas só que João da Dominga
Era amigo de João Requizado
Por isso seria difícil
Realmente complicado
Cumprir a prisão do amigo
Por ordem do delegado

Assim, para não cumprir,
A ordem do Zacarias
Passou para seu suplente
Aquela ordem do dia
O Alfredo Ataíde
Pois cumprir ele podia

Assim João da Dominga
Agiu como leal irmão
Avisou João Requizado
Do plano em execução
Requizado preocupado
Foi atrás de proteção

Foi à fazenda Ouro Preto
Perto de Bom Prazer
No município de Wagner
Comprar algo prá não morrer
Com Adolfo Madureira
Comprou uma arma prá valer

Era uma bela escopeta
Destas de repetição
Aquela com certeza
Era boa proteção
Aliada a seu revolver
E a muita munição

Alfredo Ataíde sabendo
Da compra de Requizado
Armou emboscada na estrada
Com quatro soldado armado
De fuzil com munição
Os soldado entrincheirado

Requizado retornando
Bem armado e a sós
Deparou-se com os homi
E entrincheirou-se logo após
Tiroteio foi cerrado
Recuaram pra Lençóis

Após nosso Requizado
Ter dado carreira nos homi
O Tenente Zacarias
Queria pegá-lo com fome
Sua honra tava em jogo
Sua carreira e seu nome

Armou uma nova volante
Composta de dezoito soldado,
Ordenou à essa volante
Que fossem no meio do mato
Para a Serre da Cravada
Prá prender o Requizado

Ao voltar, João do garimpo,
Com o revólver na cintura
Escopeta à tiracolo
Pelo meio das Daturas
Recebeu foi a descarga
De póiva e bala pura

Como uma jaguatirica
Requizado pulou prá trás
Pegou a sua escopeta
E atirou de forma voraz
Botou prá correr os dezoito
Soldados nos carrascais

Requizado tinha agora
Sua fama alardeada
Botou dezoito soldados
Prá correr em debandada
E a fama de um só homem
Tava então iniciada

O fulo tenente Zacarias
Mudou de tática prá ver
Mandou apenas dois soldados
Para alarde não fazer
A ordem ainda era a mesma
João Requizado prender

Perto da feira da Estiva
Requizado um doce comia
Na porta de uma amiga
Do jeito que sempre fazia
Percebeu de longe os soldados
E pensou no que faria

Mais rápido que raposa azeda
Requizado avisou a companheira
Que entrou correndo em casa
Vendo o ronco das bala certeira
Requizado não só escapou
Como de novo deu carreira

Matutou João Requizado
Que a coisa estava sem jeito
Foi-se para Iraporanga
Garimpar naquele leito
Lá nas bandas de Iraquara
Mostraria mais um feito

Um dia teve uma festa
Lá mesmo em Iraporanga
O Tenente Zacarias
Mandou tropa de capanga
Volante de oito soldados
Que eram o cão chupando manga.

O porteiro da tal festa
Amigo de Requizado
Avisou-lhe quando viu
O batalhão adiantado
Arrepara o que é que fez
Nosso cangaceiro ousado

Quando a tropa adentrou
A festa grande e feliz
Requizado aproveitou
A falta de diretriz
Adiantou-se à tropa
Trocando palavras gentis

Como a tropa não conhecia
O rosto do meliante
Requizado escapou
Daquela tropa num instante
Trocando amabilidades
Com a tropa de infantes

Quando o pobre comandante
Daquela tropa vergonhosa
Perguntou por Requizado
Ao porteiro da palhoça
Ele disse: Foi com ele
Que tu teve aquela prosa!

O tempo foi passando
E no ano de trinta e seis
Chegou o Cabo Penalva
Para resolver de uma vez
Com doze praças armados
Olha só o que ele fez

Deu uma espingarda de caça
Ao garimpeiro Carolino
Pernoitaram em sua casa
Fingindo que tavam dormindo
Pertinho da velha casa
Do Requizado traquino

Cercaram a casa dele
Logo na neblina do dia
Bem às cinco da matina
Na porta do homem batia
Requizado abriu a porta
E a bala no centro comia!

Requizado recuou
Pra dentro de sua casa
Ergueu sua escopeta
E foi respondendo a bala
Mostrando que sertanejo
Acuado é cobra braba!

Não só respondeu à bala
Como foi bem mais ousado
Escapou daquele cerco
Pelo meio dos soldado
Tirando onda com os homi
No meio do fogo cruzado

Prá proteger as crianças
E os moradores do lugar
Correu pro final da rua
Para a tropa aguardar
Uma escopeta e um revólver
E muita bala pra gastar

Novamente entrincheirado
Bem e com boa proteção
Houve novo tiroteio
Lá naquela região
Fingindo ter companheiros
Mudando de posição

Os soldados assustados
Com bala pra todo lado
Fugiram pela estrada
Correndo apavorado
Requizado tomou atalho
E chegou adiantado

Os soldados então chegaram
A uma bifurcação na estrada
Ficaram ali em dúvida
Pra onde a Estiva estava
Mas para surpresa geral
Uma voz foi escutada

“O caminho é o de lá!”
Gritou João Requizado
Descarregando a escopeta
Bem em cima dos soldado
Foi tamanho escarcéu
Que eles fugiram pro mato

Terminado o tiroteio
Requizado sumiu novamente
Os soldados então seguiram
Seu caminho lentamente
Mas depois de alguns quilômetros
Outro tiro de repente

Houve novo tiroteio
Ali na garganta da serra
De meio em meio quilometro
Requizado fazia uma guerra
Apôis muito conhecia
Aquela sua amada terra

O advento do Estado Novo
Feito por Getúlio Vargas
Em novembro de trinta e sete
O país se modificava
Sobretudo na Bahia
Governador renunciava

Tomou posse o comandante
Da sexta região
Antônio Fernandes Dantas
Coronel por profissão
Desafeto de Zacarias
Delegado por missão

Zacarias delegado
Transtornado pra valer
Largou o posto que tinha
Lutado pra obter
E foi para a capital
Sua vida resolver

O Tenente Zacarias
Foi logo substituído
O Capitão João Coelho
Homem forte decidido
Tentou de forma amigável
Ajeitar o acontecido

Mandou dois mensageiros
Antônio e Esmeraldo Sena
Dizerem que tudo aquilo
Era por coisa pequena
Que se de pronto se entregasse
Diminuía a sua pena

Requizado afirmou
Que faria o aconselhado
Porém não confiou
 Em palavra de fardado
Pros garimpos de Paus Moles
Fugiu pra não ser algemado

Nos garimpos de Paus Moles
Na Chapada Velha bonita
Esperava ter sossego
E harmonia em sua vida
Mas era mesmo sua sina
Ter a vida perseguida

Capitão João Coelho
Mandou então a volante
Prás bandas da Chapada Velha
Procurar o meliante
Quarenta homens armados
Pra pegá-lo adiante

A força chegando a Seabra
Prendeu Claudionor de Queirós
Amigo de João Requizado
Homem sabido e veloz
Foi logo tomado de guia
Para objetivo atroz

Requizado ficou sabendo
E foi à vila assistir
Na frente de uma casa
Já não se agüentando de rir
A tropa passava por ele
Sem mesmo o distinguir

Claudionor de Queirós, sabido.
Fingiu então que nada via
Porém o soldado Palmíro
O rosto de João conhecia
Chamou a atenção da tropa
Mostrando a ousadia

Os soldados insultados
Com a ousadia do rapaz
Correram prá cima dele
Com ódio de força procaz
Com armas engatilhadas
Para o cangaceiro audaz

Requizado adentrou
Uma cabana acabada
Os soldados dispararam
Uma chuva e meia de bala
Requizado com o revólver
Respondia à presepada

Saiu e se entrincheirou
Ouve então nova batalha
De um só homem com um revólver
Contra quarenta canalha
Portando potentes fuzis
E as armas de metralha

Saiu novamente vencedor
Como num pacto com o capeta
A noitinha inda voltou
Pra pegar a escopeta
Pra continuar na briga
Bala á bala, treta á treta.

Outro milico orgulhoso
Chegou à Estiva arrogante
Disposto a pegar Requizado
Levava seu plano adiante
O nome do pobre infeliz
Era Cabo Cavalcante

Com tropa de quinze homens
De objetivo ardoroso
Foram à Serra da Cravada
E dormiram em Seu Cardoso
Um velho que morava em frente
Do cangaceiro valoroso

Quando o dia já raiava
Requizado tomava café
Pelo buraco da fechadura
Viu os homens de má fé
E o Cabo à sua porta
Pronto a dar o pontapé

Requizado pegou ligeiro
A escopeta de repetição
Quando o Cabo abriu a porta
Ouviu-se a explosão
O tiro de Requizado
Pegou o Cabo de raspão

O Cabo apavorado
Ordenou a sua tropa
Que corressem atrás dele
Vasculhando toda toca
Quem se deparar com ele
Mira o cano e pipoca

O combate desta vez
Foi até o meio dia
Se bem que até a noite
Tiroteio se ouvia
A história tava crescendo
E transformando em magia

Requizado saiu ferido
Neste ultimo combate
Na fazenda de um amigo
Camarada e compadre
Cuidou e restabeleceu
A saúde à vontade

Voltou algum tempo depois
A ir à feira da Estiva
Nem por isso deu problema
Pois não arranjava briga
O povo o respeitava
Como herói de força viva

Porém em doze de janeiro
De mil novecentos e quarenta
Tenente Cordeiro de Matos
Chegava com fome sedenta
De pegar o Requizado
E acabar com aquela lenda

No dia seguinte, de pronto
Sabia ser dia de feira
Foi junto ao Cabo Crispím
Também o Sargento Bandeira
E o investigador Menezes
Pra fazer a bagaceira

Na feira deu voz de prisão
Ao nosso João Requizado
Tirou-lhe o revólver da cinta
O deixando desarmado
Seguraram o cangaceiro
E de pronto o algemaram

Requizado desarmado
Relaxou a comitiva
Tiraram-lhe as algemas
Pra não provocar ferida
Foram escoltando ele
Para a vila de Parnaíba

Vendo aquela confusão
O povo a ver os fatos
Requizado aproveitou
Desatenção dos soldados
Viu que a arma que tinha
Era o seu par de sapatos

Bateu com os sapatos no rosto
Dos soldados ao seu lado
Fugiu correndo dos homi
Que eram despreparados
Escapou mais uma vez
Do cerco dos soldados

Os milico dispararam
Seus fuzis numa rajada
Acertaram-lhe o ombro
Quando longe já estava
Dentro dum canavial
Sumiu sem deixar pegada

No dia seguinte ele foi
Em busca de Albertino
Albertino Alves de Souza
Farmacêutico muito fino
Que cuidava de mulher,
Cangaceiro e menino

Só que a bala extraída
Logo infeccionou
Foi à cidade de Wagner
Procurar outro doutor
O médico Américo Chagas
Que a chaga lhe curou

Além de curar Requizado
Deu proteção ao paciente
Pois viu que João Requizado
Naquele caso era inocente
Proteger as suas irmãs
Era mesmo coerente

Alguns dias depois
Chegou Ciro, seu irmão.
Trazendo-lhe um fuzil
E duzentas balas num sacão
Mas foi meio imprudente
Deixando rastro no chão

Assim o Tenente Cordeiro
Chegava com seus soldados
Num domingo às doze horas
Pra prender o Requizado
Cercou a casa do médico
Mas chegava atrasado

O valente Requizado
Foi pra Serra da Cravada
Com fuzil e munição
Lá por dentro da Chapada
Esperar pelos soldados
Prá mais uma presepada

O Tenente irritado
O Médico então algemou
O intimou a trazê-lo
De volta pra onde o curou
Era agora responsável
Pela entrega de quem ajudou

Naquela mesma tarde
Na companhia de um amigo
Foi a Serra da Cravada
Em busca do foragido
Uma forte tempestade
Aumentava o perigo

Depois de muita procura
Américo o encontrou
Contou-lhe o ocorrido
Requizado se espantou
Mas pelo bem de seu amigo
Requizado concordou

Saíram lá da Cravada
Com destino a Salvador
Prá se entregar aos homi
E safar seu protetor
Acabar com aquela história
E mostrar o seu valor

Atento às emboscadas
Da polícia na estrada
Requizado e seu amigo
Prosseguiam a jornada
Requizado pressentia
Que sua hora era chegada

Atravessaram a rodovia
De Lençóis a Estiva
Chegaram à Pedras de Chapéu
Sem, no entanto terem briga.
Chegaram à Lagedinho
Cortando mato e urtiga

Ao meio dia atravessaram
A ponte sobre o rio Utinga
Foram à fazenda Uruguaiana
Pelo meio da caatinga
Prá descansar os cavalos
Em meio à cassutinga

Depois prá fazenda Araçás
Trocar os cavalos cansados
Depois foram a Paraíso
Pois estavam fatigados
Iam descansar um pouco
E voltar ao combinado

Seguiram prá Rui Barbosa
Prá de ônibus ir além
Mais adiante, em Itaíba;
Iam, pois pegar o trem.
Pra chegara a Salvador
E da lei virar refém

Durante a cavalgada
De Itaíba a Rui Barbosa
A capanga de balas furou
Uma má sorte perigosa
De duzentas, sessenta e uma,
Sobraram pra dupla honrosa

Américo e João Requizado
Chegaram a Salvador
Ficaram na Pensão Glória
Rua do Bispo, sim senhor.
Todavia prá despistar
De pousada se mudou

Foram pro Hotel Maia
Lá no bairro da Calçada
O médico foi à polícia
Tentar ajeitar a parada
Ouviu foi muita pilheria
Humilhação e algazarra

Então Requizado foi preso
Na cadeia da capital
Depois foi enviado
À sua terra natal
Na cadeia de Lençóis
O seu ponto inicial

O rábula Olímpio Barbosa
Bem que tentou defender
Mas quanto àquela prisão
Não havia o que fazer
A partir deste momento
Sol quadrado vai nascer

Seis anos, a pena
Que o requizado conseguiu
Na hora do depoimento
Seus feitos ele assumiu
Na madrugada seguinte
João Requizado fugiu

Voltou então novamente
à sua Serra da Cravada
Passou foi mais de dois meses
Caindo sempre na risada
Combatendo bem, sozinho,
Dezenas de volantes armadas

Depois de mais outras tantas
Foi-se atrás de ares limpos
Foi-se prá Chapada Velha
Na labuta do garimpo
Mas sempre com um pé atrás
Como era seu instinto

Todo o seu treinamento
De guerrilha na caatinga
É comum ao sertanejo
Ter toda aquela mandinga
Usada pra caçar Peba
No meio das cassutinga

Requizado proseava
No garimpo Solidão
Numa noite muito escura
Num boteco pé no chão
Essa noite era selada
O fim da perseguição

O Investigador Eliseu
Chegou com soldados armado
Perguntou então a João
Se ele era o Requizado
Pois se fosse tava preso
E se fugisse acabado.

Requizado num pinote
Com uma capa colonial
Apagou o candeeiro
Que iluminava o local
E tentou fugir dos homi
Na escuridão total

Mas o investigador
No meio do bagaceiro
Disparou seus dois revólveres
Nas costas do cangaceiro
Que tombava desta vez
Sem revidar ao tiroteio

Naquela noite tristonha
O mesmo investigador
Obrigou o povo local
A carregar com muita dor
O corpo de Requizado
Cangaceiro de valor

Lá em Barra do Mendes
Requizado foi sepultado
Figura lendária do povo
Que sempre será lembrado
Brigou por mais de um lustro
Contra as forças do estado

Se isso vira moda
Meus caros companheiros
A lei se regionaliza
Prá alegria dos catingueiros
E os homi tremem na base
A volta dos bons cangaceiros



Entrevista com o Matuto

A obra: Um exemplo bem humorado de literatura de cordel, Entrevista com o Matuto é uma crítica não só á realidade que nos cerca, mas acima de tudo uma crítica à passividade e o medo de dizer, discutir, argumentar e modificar essa realidade.


Houve numa certa feita
Um causo de dar arrelia
Depois que vi esta história
Danei a fazer poesia
Prá contar prá vozmicês
O que houve aquele dia

Um estudante de jornalismo
Das bandas da capitá
Quis fazer documentário
 Com nosso modo de pensar
Procurou Toin Matuto
Pru mode entrevistar

Toin Matuto que era mala
Esperto por natureza
Perguntou pra quê que era
Toda aquela estranheza
E pediu que o playboy falasse
Logo tudo com franqueza

O estudante lhe explicou
Que era coisa sem desfecho
Ele só ia gravar
Suas palavras num despejo
Pois o documentário era
Sobre a opinião do sertanejo

A entrevista era simples
Era só ele responder
O que achava do sistema
O que devia ocorrer
O que devia mudar
O que devia ceder

Toin Matuto, mei cabreiro
Perguntou-lhe num sussurrar
Posso mesmo responder
Sem mesmo me amedrontar
A policia não vai me prender?
O governo não vai me matar?

O estudante lhe sorriu
Disse que não percebia
Algum motivo pra isso
Acontecer-lhe algum dia
Pois pelo amor de Deus!
O que é que ele diria?!

Toin Matuto aceitou
Fazer aquela presepada
Mas por azar do playboy
A coisa ficou engraçada
Já no início deu zebra
Pois já começava errada

Disse o entrevistador
Estou aqui com Toin Matuto
Que mesmo semi-analfabeto
Conhece e entende de tudo
Vamos ouvir a opinião
Do sertanejo resoluto

Pra começo de conversa
Disse virado na desgraça
Semi-analfabeto é você!
É você e sua raça!
Sou é analfabeto todo!
Num há conta que eu faça!

E vou logo lhe dizendo
Já que é mesmo pra dizer
O que penso do sistema
Já que não vão me prender
Não é mesmo todo dia
Que essa chance é de se ter

Começando na política
Ô racinha de ladrão
Quando tu vota e confia
O cabra tá na corrupção
E a cifra que se ouve falar
É só de milhão em milhão

O cabra vota num sujeito
De ideal Socialista
Que quando chega ao poder
Mostra-se um reformista
E se diz social democrata
Eu diria Capitalista

E pra que paga imposto?
Melhor é com a própria mão
Fazer praça e cemitério
Cacimba em mutirão
É só juntar o dinheiro
Pra cuidar do nosso chão

Repara se eu não tô certo
Assim não tem como roubar
Pois agente mesmo pega o dinheiro
Pra compra do materiá
Aí nós juntamo o povo
E começamo a trabaiá

E esse negócio de pagar água?!
Isso é negócio de demente!
A água é nossa, vem da terra
Da pedra ou da nascente
Pro sustento do bicho
Da planta  e de toda gente

Pra num falar de vender
Terra a preço de ouro
Matando o povo de fome
Roubando seu maior tesouro
Impede o homem do campo
Ter leite, carne e couro

Sem tratamento de esgoto
Polui-se em qualquer lugar
Penera-se só um pouquinho
Depois já da pra despejar
Mais um emissário submarino
Jogando esgoto no mar

E o nome do aeroporto
De nossa querida Salvador
Que lembrava a luta do povo
Por liberdade e valor
Hoje o novo nome
É o do filho de um senador

Agora vê se ta certo
Marcar horário consciente
Bem marcado, bem certinho
Num bom hospital decente
Para só ser atendido
Após o oitavo paciente!

Sair de lá revortado
Pra pegar um coletivo
E mesmo desempregado
Ou mesmo estudante liso
Ou tu paga, ou tu fica
E calado tu sai vivo

Aí tu junta as moedas
E senta bem paciente
No normal você vai em pé
Aí entra um diabo de um crente
E tu ainda é obrigado
A ouvir o pobre inocente

Esse tal proselitismo
Devia ser proibido
Pois não temo obrigação
De ouvir ensandecido
Apôis quem quiser rezar
Caminho da igreja é conhecido

Aí tu chega em casa
Tua morada de aluguel
Esperando ser aquele
O seu pedacinho de céu
Mas tu ainda tem que ouvir
Uma torre de babel

Vizinho da frente é Arrocha
Degeneração da seresta
Vizinho de traz é Calípso
E ele jura que presta
Vizinho de um lado é um crente
Me diga o que ainda me resta!

O do outro lado é pior
Pois não respeita minha labuta
Quando chego morto em casa
Em todo bairro se escuta
Bradando a toda altura
Aquele pagode de puta!

Se pensas que estou terminando
Apôis estou a começar
Veja o fio de Herculano
Levou uma pisa de matar
A puliça pegou o menino
Com um cigarrim de apertar

Agora veja seu repórte
Como o mundo ta virado
O Crack matando gente
E os puliça ocupado
Batendo em adolescente
Que tava queimando mato

Esse mato eu conheço
Mas desde pequenininho
É coisa boba, sem perigo
Já dei até uns traguinho
O problema são as drogas
Isso sim não tem caminho

E facurdade camarada?!
Ah, essa é bom cê gravar
Cuma é que pode o matuto
Pudê até ela chegar
Se o ensino é uma porquera
Aqui ou na capitá?!

Cumpadi Mané Tiburso
Diz que viu na televisão
Que na Orópa é diferente
Pra entrar não tem eleição
Quando tu terminas o estudo
Vestibular não existe não

Diz que lá remédio é de graça
Escola e computador
O cabra ganha dinheiro
Fazendo seja o que for
Seja branco ou amarelo
Preto, pobre ou cantador

Aliás, no meu saber
O problema ta é no dinheiro
Se esta merda for abolida
Conserta o Brasil inteiro
Voltando o sistema de troca
Evita-se o caloteiro

Cadeia é uma vergonha
Facurdade de ladrão
O ladrão sai assassino
Assassino sai capitão
Pois ou entra pra puliça
Ou volta á vida de cão

Bota os cabra pra produzir!
Tirar do chão alimento
Forjar no aço utensílio
Esculpir na madeira o talento
Aprender a se virar
Pois roubar não é sustento

Aí o povo faz fila
E lota um estádio inteiro
Vendo um monte de macho correndo
Atrás de uma bola o dia inteiro
E quando sai do estádio
Ocorre até tiroteio

Agora veja seu moço
Se eu não tenho mesmo razão
Um monte de babaca e idiota
Brigando em mutirão
Pra protestar se amofina
Quem dirá revolução

Mas se tem um trio elétrico
Aí a putaria é dobrada
Lota mais que visita de Papa
Que, aliás, é a escória sagrada
Escroto capitalista
Da santa igreja malvada

E o exército brasileiro
Que se julga invencível
Levou três pisas dos matutos
De Canudos inesquecível
E hoje no Haiti
Espalha o terror cível

E ainda baixa a cabeça
Para um velho conhecido
Presidente George Bush
Nazista enlouquecido
Esposo de Toni Blair
Seu amante mais querido

Tem dois cabra logo aqui
Na América Latina
Dando exemplo de atitude
Caindo logo pra cima
Enfrentando os inimigo
E promovendo uma faxina

Um momento por favor!
Pediu então o estudante
Deixe-me falar com o senhor
Antes que o senhor se espante
A promessa que lhe fiz
Não posso levar adiante

Se o que diz for veiculado
Garanto que há o que temer
Depois do primeiro parágrafo
Não sei o que pode ocorrer
Eu só sei de uma coisa
Quem vai preso é eu e você!

Peraí que inda tem mais
Meu caro amigo repórte
Tu disse pra eu falar
Tudinho sem medo da morte
Espero que este apareio
Nem uma palavra me corte

O preconceito é outro tema
Que me deixa arreliado
O branco oprime o negro
O índio e o “aziádo”
Mas não é só o povo branco
Que insiste no caminho errado

O negro também se organiza
Em grupos e movimentos
Nos quais branco não entra
E inda ouve xingamento
Não adianta ser militante
Se for branco ou sardento

E o fumante educado?
Apesar de ser fumante
Não fuma em ambiente fechado
Em respeito ao não fumante
Em respeito á criança
Ao idoso e á gestante

Mesmo assim é hostilizado
Pelo idiota não fumante
A fumaça passa longe
Mas a cara é ultrajante
E ainda diz piadinha
É o preconceito ao fumante

E o carro movido a água
Elétrico, purificado?
E a energia solar
Ao alcance do desempregado?
E a Caprinocultura
Com incentivo do Estado?

Neste momento o estudante
Temendo ser retaliado
Pelo discurso letal
Inocente e detalhado
Desligou o aparelho
Onde estava tudo gravado

Falou a Toin Matuto
Que aquilo já estava demais
Pediu que ele elaborasse
Um finalzinho de paz
Ligou novamente o aparelho
E pôs-se a falar o rapaz

Este foi o desabafo
De um pobre matuto do mato
Um pobre ignorante
Com seu modo de vida nato
Retrato da inconsciência
Que o nordeste é relegado

Agora suas palavras finais
Senhor Toin Matuto
O que tens pra finalizar
Teu discurso tão sisudo
(sussurrou por traz da câmera)
Fale de paz ou fique mudo!

Toin então pegou ar
E falou bem docemente
Ignorante é tua mãe
O teu pai certamente
Da próxima vez que vier
Explique mais claramente

Instrua-me a falar
De passarim e céu azul
De flores e borboletas
Gravatá, mandacaru
E só pra finalizar
Um pacífico TUMÁ NO CÚ!


                               


De Olho No Ambiente


A obra: Um cordel ecológico, produzido para auxiliar no processo de educação ambiental. Trata dos problemas ambientais da comunidade da Boca do Rio e adjacências.


Você conhece a Boca do Rio?
Suas vielas, suas quebradas?
Apôis se conhece sabe
Que de bairro não tem nada
Ela é comunidade
Quase que micro-cidade
Desta Salvador amada

A nossa Boca do Rio
Tem dois tesouro encantado
Um é a Mata Atlântica
Que fica por todo lado
A outra é a Restinga
Ecossistema ameaçado

Exemplo de Mata Atlântica
Na região da Boca do Rio
É o Parque do Pituaçu
Que a cidade engoliu
Hoje é o que sobrou
Da floresta que existiu

Toda mata verde viva
 Na Avenida Paralela
Com altas árvores presentes
Promovendo aquarela
E parte do Pituaçu
Ou da Mata que ali era

O parque do Pituaçu
Tem plantas medicinais
Também tem muitas flores
Orquídeas e animais
Peixes, aves e anfíbios
E remédios naturais

Lá tem o Macaco-Prego
Tem também o Porco-Espinho
Papagaios e Periquitos
Corujas fazendo ninho
Jacaré, Cobra Coral
Toda sorte em passarinho

Mas é sua lagoa
A atração preferida
Pra pesca e natação
Ela é a escolhida
Pelo menos assim era
Pois hoje ta poluída

Esgoto na lagoa
E lixo pelo mato
Tudo isso atrai doença
Enche de barata e rato
Prejudica a natureza
É sujeira em nosso prato

É uma espécie de pecado
Jogar lixo nos rios
Se eu não jogo, nem você
Logo o lixo já sumiu
Pois folha seca e papel
A terra já consumiu

O problema do esgoto
É maior do que parece
Pois a água flui em rede
Espalhando o que adoece
Se há esgoto num rio
Logo em outro aparece

Veja nosso rio das pedras
Que o fundo antes se via
Ele encontra com o mar
Ali no Clube do Bahia
Na Colônia de Pescadores
Aonde o bagre comia

Pois este nosso rio
Ainda é vivo, pode crer!
Tem Bagre, Tamboatá
Traíra a se esconder
Tartaruga a nadar
E Tilápia a aparecer

Tem também o caranguejo
Guaiamu em extinção
Tem mesmo tudo isso
Mesmo com a poluição
Do esgoto que é lançado
Sem pena ou decantação

Este rio nasce no meio
De um monte de pés de bambu
Em minadouros no brejo
Do parque de Pituaçu
No bairro do Bate Facho
Da represa de água azul

O rio que já é poluído
Do Bate Facho ao mar
Receberia na cheia
A água pra lhe salvar
Mas a água do Pituaçu
Também tem esgoto por lá

O Pituaçu por sua vez
Recebe muita porcaria
Esgoto dos bairros em volta
Burguês ou periferia
A maioria não tem dinheiro
Pra fazer o que devia

A EMBASA bem que podia
Acabar com este tormento
Ligar o esgoto do povo
Na rede sem pagamento
E só para finalizar
Promover o Tratamento

Se achar que terminei
De falar da poluição
Pois o Pituaçu recebe água
Da Lagoa da Paixão
Que vem da Bacia do Cobre
Todos em degradação

Aproveitam que o parque
Se quer foi delimitado
E ainda por cima pertence
Aos poderes do Estado
Destroem o que ainda resta
Com Faculdade e Condomínio Fechado

Assim muitos dos animais
Presentes em nossa região
Somem as que podem sumir
Quem não pode vai á extinção
Apôis acabando com a mata
O bicho não tem opção

Quem conhece a Boca do Rio
Sabe de nossas dunas de areia
A vegetação da Restinga
É da lista da morte a primeira
Pois é frágil e sensível
Apesar de ser guerreira

Agora na comunidade
Na nossa Boca do Rio
Vemos muitos Gaviões
Morrendo de modo febril
Caindo ainda filhotes
Morrendo bichos aos mil

Lagartos e Passarinhos
Insetos e Gaviões
Todos perdendo a mata
Em nome das construções
Perdemos muito e ainda
Vamos perder aos milhões

Tudo isso é evitado
Com uma boa educação
Uma parceria do Estado
Com nossa população
Um filho bem educado
Não joga lixo no chão

O povo separa o lixo
O estado vem buscar
Com o lixo reciclado
Todo mundo vai ganhar
E nossa comunidade
Bem mais limpa vai ficar

Lixão perto de escola
É problema em quantidade
É doença, é mau cheiro
Bactéria em atividade
Mas infelizmente é comum
Em nossa comunidade

Se o povo reclamar
Exigir resolvimento
Pra parar a poluição
E acabar com o tormento
É só exigir da EMBASA
Do esgoto o Tratamento

Já pagamos no imposto
Por mais esta solução
O tratamento ta incluso
Se pagar é obrigação
Garanto que o tratamento
Resolve um problemão

Assim não precisa Emissário
Jogando esgoto no mar
Como querem fazer no Corsário
Para nossa praia acabar
Mas se o Coco veio da África
Garanto o esgoto Voltar

Outra grande solução
Pra nossa comunidade
É plantar árvore no chão
Mas em grande quantidade
A nossa Boca do Rio agradece
E fica verde de verdade

Pedir então á CONDER
Do Parque a Delimitação
Parar de vender os pedaços
Do que ainda temos de são
Pois o reto na verdade
Já não tem recuperação

Exigir que as barracas
Da praia da comunidade
Sejam sempre todas de palha
Pra evitar a maldade
Do concreto que destrói
 Toda naturalidade

Conhecer melhor as plantas
Nativas da beira praia
Replantar as que sumiram
De forma meio arbitrária
Plantar novamente as flores
Que logo logo se espalha

O povo do Bate Facho
Povo bom e consciente
Faz mutirão de limpeza
Pra limpar o rio corrente
Garanto se assim fizer
O povo fica contente

O povo do Pituaçu
Tem muito o que fazer
Replantar bem a Taquara
Pra não desaparecer
Tirar o lixo da mata
Para a mata florescer

Baixa Fria e Cajueiro
Povo bom e de valor
Tem nas dunas de areia
Pelo menos o que restou
Um pedaço de Restinga
Pra cuidar com muito amor

No Bananal o povo pode
Alto do São João também
Alto do Beira Mar
Pode ir bem mais além
Se juntar ao mutirão
Por um Pituaçu do bem

O Marback setor dois
Tá perdendo sua mata
Dali prá baixo é matança
Até o brejo da baixada
Se não se mobilizar
Logo a vida se acaba

Todos os outros sub-bairros
De nossa comunidade
Que não tenham um só pedaço
De natureza de verdade
Pode fazer este sonho
Se tornar realidade

Lembrando ao poder público
Fazer sempre sua parte
Tratamento de esgoto
Bem antes que seja tarde
Recomposição da mata
E no lixo reciclagem

Vivendo em harmonia
O homem e a natureza
Salvador dando o exemplo
De luta e de grandeza
E a comunidade fica
Realmente uma beleza




Roda de Poesia, uma boa idéia!














A obra: com uma breve viagem ao sertão de Valente, Luar do Conselheiro nos leva a conhecer alguns poetas populares daquela região, e,  boas idéias nos traz. Já concordando com o verso, que cada comunidade tenha uma roda de poesia!


Vou contar uma experiência
Que dá certo em todo lugar
Que traz vida pra cidade
No bairro faz se juntar
 Além disso, inda dá corda
Prá cultura popular

Na década de setenta
Na Praça da Piedade
Na cidade do Salvador
Surgiu uma irmandade
Chamada Poetas da Praça
Prá gritar por liberdade

Poeta Geraldo Maia
Douglas de Almeida e Agenor
E tantos outros poetas
E poetizas de valor
Deram um bom exemplo
De arte e de amor

Chegando eu em Valente
Terra de bode e sisal
Pequena cidade baiana
De povo de alto astral
Cidade de muitos poetas
Cantadores de traço real

Notei o tédio na praça
Da linda igreja matriz
Pensei que poderia haver
Algo artístico e feliz
Algum tipo de espetáculo
Que o povo pedisse bis

Procurei o amigo Aliã
Poeta nativo em Valente
Contei a idéia da roda
E ele me sorriu contente
Pois a idéia da Piedade
Ele já tinha na mente

Caiu como uma luva
A roda de poesia
Eu e Aliã procuramos
Na cidade noite e dia
Poetas e Aboiadores
Cordelistas e companhia


Pedimos a doce Arlene
Para avisar ao povão
Na Valente FM
Fez-se a divulgação
Segundas e sextas-feiras
Na praça reunião

Pedimos a Rosival
Amigo de todo sempre
Que arranjasse a divulgação
Também na Sertão FM
Prontamente atendeu
Acredito que ele lembre

Fazíamos uma roda
No centro um poeta entrava
E lá no meio do círculo
Seu poema declamava
O povo que tava em volta
Aplaudia e se animava

Começou com pouca gente
Eu, Aliã e Tytta Ferreira
Arlene, Léo e Arlesse
Da Cachorra na pareia
Às vezes vinha Jared
Só pra ver a bagaceira

A coisa foi engrenando
Cada dia vinha mais gente
Até Mestre Velho Moza
Veio fazer seu repente
A praça ficava cheia
De rostinhos sorridentes

Um dia veio Seu Bigode
Cabra bom e respeitado
Que corre a fama em Valente
Que teve o melhor cavalo
Na roda disse seus versos
De um sarcasmo meio ousado

Fazíamos concentração
No Bar de Zé de Carlinda
Ouvindo Dó Nascimento
Bebendo Cerveja e Pinga
E às seis horas da tarde
A roda Na praça tão linda


A APAEB gostou
SICOOB-COOPERE também
Logo a TV VALENTE
Levou a gente além
Vendo na televisão
Muito orgulho todos tem

Até Marivaldo Sales,
Companheiro, recitou
Sua esposa Cristina Moura
Foi lá e complementou
Com versos magistrais
E nossa roda abrilhantou

Aliã se esbaldava
Brincava com poesia
Pois os versos deste cara
São seu ar do dia a dia
Transformava sentimento
 Em palavra com magia

A Roda de Poesia
Da Cidade de Valente
Passou a ser conhecida
Quase que regionalmente
Íamos nos apresentar
Aonde tivesse gente

Fizemos em Nova Palmares
E na UNEB em Coité
Comunidade Cabochard
Fizemos versos com fé
Pedras Altas, São Domingos.
Com cachaça e com rapé

A idéia foi na lata!
Funcionou que é uma beleza
Além de nos alegrar
Mostrou a nossa grandeza
Fez o povo se conhecer
E mostrar sua proeza

Vejam só como foi fácil
Montar uma Roda de Poesia
Pois isso pode ser feito
Em toda e qualquer freguesia
Bota o povo prá pensar
E prá trazer alegria


Você que leu o cordel
E gosta da nossa cultura
Que faz verso, conta prosa.
Ou rabisca literatura
Preste atenção na idéia
Feita de vontade pura

Se teu bairro ou tua cidade
Tem uma praça abandonada
Ou uma pracinha qualquer
Que não desenvolva nada
Preste bem mais atenção
Que a idéia foi lançada!

Reúna uns dois amigos
Que poesia apreciem
Converse direito com eles
                                                     O movimento iniciem
Procurem o poder local
E peçam que financiem

Financiar não é muito
É por mais luz na pracinha
É ajeitar o jardim
Pondo mais umas plantinhas
Se vacilar, em mutirão
Ajeitam a praça todinha

O próximo passo agora
É procurar todo poeta
Preste atenção que agora
Esta será sua meta
Uma de muitas maneiras
É organizando uma festa

É claro que esta maneira
Não é só o que tens a fazer
Procure nos bares a noite
Aonde eles vão se esconder
Pergunte ao dono do bar
Que poetas ele vê

Faça uma reunião
Com os poetas da cidade
Apresente a idéia
Com toda propriedade
Procure a mídia local
E informe a novidade


Lembrando algo bem sério
Sobre a rádio comunitária
Ela tem a obrigação
De nunca ser sectária
Divulgar toda cultura
Que houver em sua área

Escolham legal a hora
Que seja de preferência
No início da aurora
Pra evitar impaciência
Do sol que incomoda
Toda e qualquer consciência

Bem no centro da praça
Abra uma roda de espaço
No centro, um de cada vez
Entra e faz estardalhaço
E o povo todo em volta
Aplaude logo no encalço

A poesia é uma arte
Tira o povo da depressão
Faz o povo protestar
Desenvolver sua paixão
Registrar a sua história
E fazer revolução

Logo tu vai perceber
Todos têm um sentimento
Um romântico, outro podre
Outro triste num lamento
Outro revolucionário
Outro com conhecimento

Assim vai ficar mais fácil
Para a dupla poder formar
Pra fazer dupla no verso
E os dois poderem rimar
Um triste com um alegre
prumode experimentar

Logo logo cês vão ver
O que é animação
Todo mundo fazendo verso
Na praça que tinha ladrão
Velhos e jovens crescendo
Com enorme integração


Isto não é mais uma idéia
Destas que se vê por aí
Pois esta experiência
Dar errado nunca vi
Eu mesmo participei
Por isso que falo aqui

Ela te faz conhecer
O povo da comunidade
O povo do seu município
O povo de sua cidade
Também é trabalho em grupo
Melhora a sensibilidade

Faz o povo se expressar
Crescer e evoluir
Depois de versos trocados
Amores podem surgir
E alem disso o povo
Vai poder se divertir

Se tiver achando pouco
Pode fazer desafio
Ver quem faz verso mais rápido
O bom repentista sadio
Pilhérias brincadas no verso
Sem mexer com quem pariu

Pode-se ainda fazer
Um livro de poesia
A coisa não é difícil
Escolhe os poemas num dia
Depois qual vai ser a capa
Pro livro ter alegria

Agora só tem uma magia
Correr atrás de patrocínio
Empresas e prefeitura
Mercados e condomínio
Ou fazer uma vaquinha
Com quem possui o domínio

Garanto que a idéia funciona
Ponha em prática e vai ver
Uma Roda de Poesia
Pode até fazer chover
Chover aplausos e risos
Amizade e bem querer


Agradeço a Aliã
E aos Poetas da Praça
A toda turma deValente
Terra de gente de raça
Terra de carne de bode
De sisal e de cachaça

Agradeço aos poetas
Que recitaram em nossa roda
Esperamos que esta idéia
Se transforme logo em moda
Quero ver fazendo verso
Os cabra valente da roça

A cultura popular
Agradece a energia
De quem puder continuar
Esta idéia algum dia
Que toda comunidade
Tenha uma Roda de Poesia.






























O Jirimum de antigamente











A obra: Nesta obra o autor ressalta a importância
Das sementes que não são geneticamente modificadas, patrimônio da humanidade, para que não sejam extintas como aconteceu a uma infinidade de espécies de nossa flora, especialmente espécies cultivadas por nossos indígenas.



Digo cá meus companheiros
Nunca vi noutro lugar
Só acontece no sertão
O que agora eu vou contar
Olha só pra você ver
Como é longe do mar

Nos confins destas caatingas
Havia lá um aglomerado
Construído num belo morro
Nos lajedos incrustados
As casinhas bem humildes
Mas tudo muito arrumado

Morava no alto do morro
 Um Tal de Zé de Donana
Um velhinho solitário
Viúvo e pé de cana
Cabra bom trabalhador
Da rezadeira Mariana

Abaixo de Zé de Donana
Morava Antoim Malaquia
Casado com Dona Moça
Mãe de João e Maria
Antoim trabalhava na roça
Maria na lavanderia

Mais abaixo era Zefa
A cumadi cangaceira
Criou três filhos sozinha
Levando verdura prá feira
O marido foi prá São Paulo
E casou com uma rameira

Abaixo de Dona Zefa
Vivia o violeiro Tião
Poeta e repentista
Filho daquele sertão
Amigo dos animais
Festeiro e bom cristão

Tudo neste povoado
É tranqüilo e amigável
Se não tem boa relação
Pelo menos é instável
Lá todo mundo trabalha
Não existe irresponsável


Quando alguém lá fatura
Na colheita ou na labuta
Prepara-se um banquete
Carne, folha, flor e fruta
E todos os convidados
Partilham o fruto da luta

Mas o que eu quero contar
É o que um dia aconteceu
Neste velho morro alto
Abençoado por Deus
A coisa até pode ser simples
Mas pense que me comoveu!

É que cada casa que havia
Possuía um pequeno terreno
A cerca que separava
Não impedia o que era pequeno
Por isso era muito comum
Um plantando, outro colhendo

E assim aconteceu
Com um pé de jerimum
Um bonito pé de abóbora
Como nunca vi nenhum
Uma semente especial
Vinda lá dos Inhamuns

Um dia de sol de verão
Tião nosso violeiro
Dando uma brasa sentado
Num tronco véi de juazeiro
Viu que adentrava o quintal
Um pé de planta rasteiro

Ele foi logo examinando
A planta que ali invadia
Passando por baixo da cerca
Palmo a palmo, dia a dia.
Viu que era jerimum
Ao menos é o que parecia

Era uma abóbora estranha
Diferente das normais
Vinha do quintal de Zefinha
Uma velha guerreira da paz
Deve ser produto da feira
Que todo domingo ela faz


Tião ficou satisfeito
Com a planta invasora
Pois com um pouquinho de sorte
Era até de outra lavoura
Talvez até de São Paulo
Ou outra terra promissora

Tião cuidou desta planta
Por várias semanas a fio
Logo logo fulorou
Deixando as abelhas no cio
Depois desta fecundação
O fruto logo se viu

Prá surpresa do poeta
Eram umas abóboras sem graça
Mei grande, mei pequena,
Com uma cor de ninho de traça
Mas pelo peso das bicha
Eram mesmo boa de massa

Eram quatro jerimuns
De tamanho razoável
Ele ficaria com três
Pois foi delas responsável
A outra era de Dona Zefa
A Guerreira incansável

Ao chegar à porta dela
Gritou pela doce vizinha
Logo logo apareceu
O semblante da velhinha
E pelo cheiro do café
Ela vinha da cozinha

Tião pediu café
Dona Zefa lhe serviu
Pediu que ficasse à vontade
Ele logo consentiu
Disse trazer um presente
E Dona Zefa Sorriu

Vendo a abóbora sem graça
Que deu no quintal de Tião
Ficou mei decepcionada
Com toda espera em vão
Era uma coisinha chocha
Sem brilho e sem razão


Mas com toda sua doçura
Agradeceu o presente
Levou o jerimum pro girau
Com uma carinha descrente
Voltou e falou a Tião
Pausada e calmamente

Este pé de jerimum
Digo-te não fui eu que plantei
Ele invadiu minha cerca
De onde ele veio não sei
Deve ser de Dona Moça
Mas confesso que cuidei

Tião voltou pra casa
Prá pegar mais um jerimum
Prá levar pra Dona Moça
Que não tinha ganhado nenhum
Acima de Dona Moça
Só havia então mais um

Ao bater na porta velha
Da casa de Antoim Malaquia
Quem veio lhe receber
Fora sua filha Maria
Prontamente abriu a porta
E perguntou o que ele queria

Tião então presenteou
Com a abóbora a menina
Contou o que lhe ocorrera
Com sua vizinha de cima
A menina riu-se toda
Pois igual foi sua sina

A menina chamou Tião
Para ver o seu quintal
Mostrou que o que lhe ocorrera
Com eles também foi igual
Aquele pé de jerimum
Passou sua cerca de pau

Tião apesar de cansado
Voltou contente prá casa
Pois a planta deu quatro frutos
Bem certinho um pra cada
Pegou a penúltima abóbora
E voltou a subir a escada


Ao chegar em Zé de Donana
Tião viu a origem da planta
O velho recebeu a abóbora
Feliz e dizendo ser santa
E prá explicar por que
Ele logo se adianta

Essa aparência sem graça
Engana o homem descrente
Em sabor não se iguala
Garanto! Experimente!
É melhor e mais nutritivo
O jerimum de antigamente

Disse esta variedade.
Não se encontra no mercado
O que lá se vê são maiores
Bonito, brilhante e pesado
Mas bem menos nutritivos
 por ser anabolizado

As frutas de antigamente
Menores e vitaminadas
São tristemente esquecidas
Ao passado relegadas
Mas uma coisa eu garanto
Por mim serão cultivadas!

Cês tinham que ver a cara
Do nosso violeiro Tião
Com toda certeza do mundo
Aprendera mais uma lição
O que é bom não se abandona!
E sim se semeia o chão!
















ABC da Hipertensão Arterial








A obra: Um Cordel encomendado por uma Médica, com o intuito de informar a população de uma doença que acomete grande parte da população, Luar do Conselheiro traz a linguagem popular informações importantes de saúde pública.


Vou falar de assunto sério
Hipertensão Arterial
Um problema de saúde
De proporção mundial
Que se não tratada logo
Pode ser mesmo Fatal

Hipertensão Arterial
É o aumento da pressão
Das artérias que irrigam
O sangue pro coração
Quando a pressão aumenta
Provoca um problemão

Como é que isso ocorre
É bem fácil imaginar
                                                  Se um cano D’água entope
A água não vai passar
Aumentando a pressão
O cano pode estourar

Como o cano da cozinha
Entope com a gordura
Assim as nossas artérias
A mesma coisa atura
Cada vez que optamos
 Por comida com fritura

O entupimento das artérias
Dá problema de montão
Infarto entre outros
Problemas no coração
Complica todos os órgãos
Pela má circulação

Infelizmente na verdade
Poucos sabem da real
Por isso tantos morrendo
Outr@s em estado fatal
Enquanto outr@s ainda terão
Hipertensão Arterial

O milagre ainda é o mesmo
Que nossa Bisavó já dizia
Que a nossa avó repetiu
Que a nossa mãe repetia
O que temos que fazer
É o que antes se fazia
É sempre melhor prevenir
Melhor do que remediar
A nossa alimentação
Teremos que balancear
O álcool só no social
Temos que parar de fumar

Alimentos enlatados
E comida gordurosa
Por mais que seja bonita
 E ainda que seja gostosa
Se comer o moderado
É ter vida harmoniosa

Além de comida saudável
Moderando as de origem animal
Outro grande causador
Da hipertensão Arterial
É o uso em demasia
De um condimento natural

O sal estraga o gosto
Pois muda o sabor do alimento
Quando usado em exagero
Não produz melhoramento
Pois destrói as nossas células
Produzindo agravamento

O Álcool e o Cigarro
Em açúcar se converte
Enfraquecem o organismo
Se espalhando feito peste
Piorando ainda mais
 A saúde que inda reste

Assim quem é hipertenso
Precisa abusar das verduras
Frutas e carnes saudáveis
E eliminar as frituras
Acompanhar sua pressão
E fazer esporte e aventura

Namorar em demasia
E cuidar de sua saúde
Usar bem pouco sal
Este inimigo rude
Das células do nosso corpo
Que pedem que isso mude
Mas é sempre bom lembrar
 Que uma vida com esporte
 Sem álcool em demasia
É sempre muito mais forte
 E tudo isso inda te deixa
Pouquinho mais longe da morte

É claro que há outros fatores
Que lhe pedem atenção
Observar se em sua família
Há caso de hipertensão
Pois é caso bem comum
A tal predisposição

O machucado que se tenha
Demora a cicatrizar
Pois o sangue sob pressão
Demora a estancar
Até numa hemorragia
Pode também resultar

A pessoa ronca a noite
De dia é sonolent@
Engorda em demasia
E seu ritmo é lento
Tudo isso pode ser
A doença em surgimento

Comida rica em potássio
Também ajudam o combate
E a redução do sal
Nós fazendo nossa parte
Garanto a redução
De Derrame e infarte

Buscando o melhoramento
Do corpo e da nossa saúde
É necessário sempre ter
Uma bela atitude
De equilíbrio para ter
Na saúde juventude

Equilíbrio no comer
Equilíbrio no pensar
Equilíbrio no beber
E mesmo no degustar
Equilíbrio no fazer
Começando a se estudar
Saber o que lhe destrói
E o que te alimenta
Como funcionam as coisas
Do corpo que tu sustenta
Procurar na medicina
Que ela te orienta

Ter vida com saúde
É saber o que fazer
Para estar equilibrado
 Para um bom envelhecer
Garanto se assim fizer
Quem ganha mais é você

Como vemos neste mal
Que aflige muita gente
Sem mesmo a maioria
Estar mesmo consciente
A prevenção de muitos males
Depende mesmo é da gente

Por isso fiquem atentos
Aos sintomas da hipertensão
Cuide bem de sua saúde
Com os toques que aqui estão
E lembre-se de uma coisa
SAÚDE É EDUCAÇÃO!





















Os Guerreiros do Arco-íris






A obra: Uma profecia feita há mais de cem anos por uma índia da tribo Cree, é o tema deste cordel realista; a destruição do planeta já é algo visível, tanto quanto suas conseqüências, o autor vem através deste cordel pedir mais atenção com o nosso planeta.





Atenção eu peço a todos
Gostaria de falar
Sobre um nobre assunto
Que eu quero divulgar
Não só por achar bonito
Mas bem por acreditar

É uma história antiga
Profecia mandada do céu
Para chegar aos pequenos
Por isso transcrevo em cordel
Faço aqui a minha parte
E cumpro o meu papel

Não é de agora minha gente
Que nossa Mãe Terra avisa
Prá cuidarmos das florestas
De água e da terra viva
Dor ar que nós respiramos
Do cheiro da relva florida

Esta profecia é passada
De geração a geração
Por tribos e movimentos
Do planeta em ação
Hippies e ambientalistas
E gente de bom coração

A profecia foi feita
Pela índia “Olhos de Fogo”
Índia da tribo Cree
Norte americano povo
A profecia se espalhou
Depressa pro mundo todo

Um dia que não está longe
A terra vai adoecer
Os pássaros cairão dos céus
Os mares vão escurecer
Os lagos irão secar
E os peixes vão morrer






Neste dia todo índio
E quem ama a natureza
Perderá o seu espírito
Felicidade e beleza
E verá então a mote
 De um mundo de grandeza

Porém pela graça divina
A força vamos recuperar
Para ajudar a Mãe Terra
De novo se purificar
Trazer verde vida pro mundo
E cada semente plantar

Estes índios, estes povos
Da raça dos “Homo gentilis”
Tem o coração imbuído
Da fé que quero que admires
Pois quem cuida da Mãe Terra
São os Guerreiros do Arco-íris

Quero pedir que observe
O mundo como evolui
Estão devorando as florestas
A água e o ar se polui
Quero saber meu amigo
Se eu fui claro ou não fui

A pesar de parecer
Mais um clamor ambientalista
Ou até para alguns
Devaneio indianista
Mas se parar pra observar
A profecia é realista

Os Hippies sinalizaram
O Green Peace divulgou
Jornal Zine CLÂdestino
Punk e índio semeou
E lá vai a profecia
Que índia profetizou

A Família Arco-íris
Só cresce por este mundão
Pretende modificar
E fazer revolução
Contra a guerra, o esgoto.
A morte e a poluição
Por com certeza acreditar
Nesta antiga profecia
No cordel eu contribuo
E reforço na Cantoria
Agradeço as atitudes
Pelo planeta magia

Não jogue lixo no rio
Não jogue lixo no mar
Não jogue lixo na mata
Na horta ou no pomar
Não jogue lixo na praia
Nem na rua ao caminhar

Esgoto deve ser tratado
Duas três vezes ou mais
Água limpa vai pro rio
Com o sólido adubo faz
O resto é puro e volátil
Econômico Biogás

Plante sempre alguma coisa
Mesmo que seja num vaso
Temperos e hortaliças
Cada gosto é um caso
Se puder plante árvores
Em lugares ao acaso

O lixo pode ser separado
Papel, orgânico, metal
As pilhas são separadas
Plástico, vidro e tal
Parece uma coisa chata
Mas facilita no final

Ligue seu esgoto na rede
E exija o tratamento
Se a empresa não ceder
Organize um movimento
Saneamento é um direito
Como emprego e documento

Às idéias absurdas
Seja sempre contrário
Desmatamento, despejo
Caça ou emissário
A Terra espera de você
Seja revolucionário
Não compre animais silvestres
Prá servir de estimação
Se comprar prá ajudar
Procure uma instituição
Que entenda do animal
Para reabilitação

Organize uma horta
De plantas medicinais
Ou num terreno baldio
Ou num terreno de traz
Divida com a comunidade
E da semente plante mais

Não compre peixe ou lagosta
Em época de desova
Camarão a mesma coisa
Caranguejo e Tarióba
Crustáceos e mariscos em fim
Ou extintos vão à cova

São atitudes como estas
A resistência a destruição
Pesca com bomba é grotesca
E a pesca de arrastão
Poluição vai pro mangue
E evita reprodução

Pouca gente já sabe
O caranguejo tá na lista
A extinção está chegando
Das mãos do homem egoísta
Vai faltar o caranguejo
Em pança nativa ou turista

A briga da gente é voraz
E o inimigo cruel
Destrói hectares de mata
Para produção de papel
Jogam dejetos na água
E fumaça química no céu

As guerras são outro ponto
Que é bom se levantar
Além de acabar com pessoas
Também destrói o lugar
As plantas e os animais
No seu próprio habitat
Um Guerreiro do Arco-íris
Combate no seu dia a dia
Seja só com atitudes
Ou com canção e poesia
Gostaria que todo mundo
Pudesse ler a profecia

Participe na escola
No bairro, na faculdade
Em Ongs ou em partidos
Jornais da sua cidade
Mostre à Terra disposição
E a você força de vontade

As sementes não pesam
Carregue algumas no bolso
Ainda que algum idiota
Resolva te chamar de louco
O mínimo que você fizer
Tenha certeza, não é pouco.

É aquela velha história
Do incêndio na floresta
Com o bico do beija-flor
É salvo o que ainda resta
Pois com muitos beija-flores
Grande ajuda se presta

A poluição gerada
Pela queima, combustão
A camada de ozônio
Sofre uma corrosão
Um buraco então é feito
O resto é insolação

O problema não é só
Com a pele do Ser Humano
Derretendo as geleiras
Aumenta o oceano
As terras são inundadas
Dia a dia, ano a ano

Fora que acontece
O que a índia nos falou
Com poluição no ar
Passarinho não voou
Água suja não tem peixe
Floresta se acabou
Fumaça faz nuvem escura
Impede passagem de luz
Sem luz o milho não cresce
Sem milho não tem cuzcuz
É como se algum curísco
Botasse no sol um capuz

O gado não come relva
Pois relva também não tem
Não adianta reclamar
Pois carne não tem também
Assim viver deste jeito
Não agrada mesmo a ninguém

O pior é que não adianta
Falar deste tema profundo
Até filmes americanos
Falam deste fim do mundo
Mas o telespectador
Não acredita bem no fundo

Crêem ser uma viagem
 Destas de LSD
Que algum idiota topou
Produzir para vender
Não sabe o idiota é ele
Que não vai ter pra onde correr

Pra mim esta profecia
Mais parece previsão
Vai acarretar problema
Se não dermos atenção
Vai mudar a nossa esfera
E trazer destruição

Ofereço no Cordel
Espaço pra discutir
Esse assunto importante
Pra gente desconstruir
A construção do colapso
Que ajudamos a gerir







Ainda que este cordel
Seja só plumas ao vento
Me tranqüiliza saber
Que existe movimento
A família do Arco-íris
Que luta todo momento

Se um dia perceber
O que está a sua volta
Na antiga profecia
De uma velha índia morta
Ajude no que puder
Dê a terra uma escolta

Assim como tens amor
Pela Mãe que lhe deu vida
E tudo você faria
Pra curar sua ferida
Vamos pensar com amor
Na nossa Mãe terra querida

Tome uma atitude
De fé, força e valor
Não esqueça a fidelidade
Coragem e muito amor
Brigue com garra e gana
Valentia e furor

Busque na natureza
Algo que te inspire
Beba água mais pura
Ar mais saudável respire
E seja mais um guerreiro
Da Família Arco-íris

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